quinta-feira, 23 de setembro de 2010

"O 'Cara'" - Capítulo 2

            - Opa! Como vai Dona Lúcia? Tudo Bem? – Perguntei ao chegar atrasado, para a reunião do pessoal. Lá estavam os mesmos de sempre, o cara que parecia o Che Guevara, só que com formigueiro no rabo e a veia com seios brochantemente grandes e caídos.
            - Tudo bem, Cara, e tu? Mais calmo? – perguntou ela com um sorriso simpático... Como é gata!
            - Melhorando, digamos.
            - Ok... Alguém quer começar primeiro? Ou eu preciso chamar alguém? – perguntou Lúcia.
            - Eu! Eu! Eu! – Levantei a mão, falsificando toda uma empolgação, porque sei que ela não quer que eu vá primeiro. Não depois da ultima vez.
            - Alguém mais além do Cara aqui?
            Nada.
            - Qualquer um? – Insistiu.
            Nada. Digamos que eu fiz um... Acordo... Bem educado e gentil com eles e eles me deixariam começar primeiro.
            - Certo – Disse ela com um desanimo camuflado por simpatia – comece.
            Antes de começar dei uma olhada nas caras daqueles abobados e vi que quando nossas visões se cruzavam, eles desviavam o olhar. Ótimo.
            - Muito bem, vou começar de onde eu parei semana passada. Onde eu estava? Ah, sim...
            - Oi, Cara, tudo bom? – Perguntou o professor José. Meu sangue gelou, fiquei sem voz e as pernas tremiam. Como? Como diabos? Eu estraçalhei a cabeça dele a cadeiradas!! Era pra ter sido decretado luto e minha cara estar em todos os jornais nesse exato momento! E o pior! Não era pra ele estar falando comigo! No mínimo ele tinha que fugir de forma histérica, não cumprimentar sendo simpático e educado. Meu Deus! Será que eu sonhei com aquilo?
            - O-oi, p-professor. Tu-tudo bom? – Gaguejei.
            - Tudo bem, com um pouco de dor de cabeça, mas passa.
            AI CARALHO!!!
            - Não tinhas que estar em aula agora não? São quase nove. – Ele disse olhando o relógio.
            - É... Tive um imprevisto em casa e me atrasei... Vou indo nessa! Tchau! – Não ouvi se ele me deu tchau, nem quis saber, simplesmente corri pra dentro da sala.
            Cheguei na porta da sala e bati. Pedi licença para a professora Cláudia, de biologia e entrei. No fundo da sala, como de costume, a turma de filha da puta que eu tanto amo. São seis desgraçados que – no momento – são inofensivos.
            A aula terminou e a próxima professora entrou. A Rafaela, de literatura. Oh Shit! Ela me viu todo ensangüentado! É agora.
            - Bom dia – Disse ela com seu jeito adoravelmente arrogante. Uma maravilha de pessoa.
            Ela deu a maldita aula dela sobre o romantismo e foi embora. Porém, ela vez ou outra me olhava, mas eu sentia que tinha algo de estranho naquele olhar. Tem alguma coisa muito estranha acontecendo aqui e sinto que preciso ficar alerta.
            Coincidência ou não, o Thiago não foi à aula naquele dia e o estranho é que as pessoas não pareciam sequer sentir a falta dele.
            Depois do intervalo – o recreio – teve a aula dele... Daquele... DAQUELE!
            - Cara... por favor...
            - CALA A BOCA VADIA! TU ACHAS QUE É FÁCIL? – interrompi a Lúcia.
            - Por favor, se acalma!
            - EU ESTOU TENTANDO!
            - Respira fundo, não me faça chamar a segurança, por favor!
            - Desculpe-me, é que é muito difícil pra mim lembrar...
            - Ok, ok! Vamos parar por aqui?
            - Não, por favor, eu preciso, vai ser de grande ajuda.
            - Certo, mas eu vou chamar os seguranças por precaução, ok?
            - Se eles conseguirem me deter, vá em frente. – Começou a se ouvir alguns choros e rezas na sala.
            30 segundos depois estavam lá os seguranças.
            - Como demoram... Eu poderia acabar com a raça de muita gente aqui nesse tempo.
            - A senhora precisa que o tiremos daqui agora? – Disse um armário falante vestido de preto para a Dona Lúcia, enquanto o outro se aproximava de mim.
            - É só por precaução, ele ainda é instável.
            - Ok. – Respondeu o armário.
            - Humberto.
            - Como, Cara? – perguntou Lúcia.
            - O nome do filho duma égua é Humberto, professor de física.
            - Parabéns, conseguisse te controlar. – Disse ela abrindo um sorriso lindo e sincero.
            - Eu disse que estou melhorando.
            - Consegue continuar?
            - Acho que sim, mas chamem reforços por precaução. – Falei olhando para o armário de preto que estava perto de mim.
            - Como preferir. – E não é que ela chamou mesmo?
            - Bueeeno! Vamos começar mais uma aulinha barbadinha de física, meus queridos alunos? – disse aquele duende macabro. Menos de um metro e sessenta de altura, porém a maldade residente naquele coração é imensurável, é o diabo em pessoa... – Ah, sim, estou com as provas corrigidas, e adivinhem só? A maioria já pode se considerar com o pé na cova. Vou chamá-los um por um e venham pegar sua prova. Dona Gabriela!
            - Oi. – respondeu a loira baxinha peituda e gostosa.
            - Vem pegar a tua prova.
            Ela foi até lá e quando ela tocou na prova...
            - ZERO! Conseguisse fazer a pior prova das quatro turmas de terceiro ano! HAHAHAHAHAHA
            E a pobre alma retorna chorando.
            - Manoel! – bradou ele – queres a prova ou posso só dizer a nota?
            - Quero a prova.
            - Ta, vem pegar, mas tirasse zero.
            - Lúcio! – nenhuma resposta – Lúcio? – nada. – Nem preciso dizer que esse já está morto. hahahahaha
            Não sabia como me sentir, afinal, tinha gente que realmente era pra estar morto e não estava, mas o maldito me olhou com a mesma cara da Rafaela... Meu Deus o que está acontecendo aqui?!
            - Cara?
            - Espera aí, ele te chamou de cara? – perguntou a Lúcia.
            - Não, é que eu não quero que esses otários saibam o meu nome.
            - Ah, como quiser, continua.
            - Presente, professor.
            - Não é a chamada animal, é a prova, e tu tiraste zero também! Menos um por causa dessa idiotice de “presente professor”.
            - Preciso contar aos amigos que foi aí que todo o inferno que até então parecia irreal, começou a tomar forma. Esse foi o dia que minha vida mudou pra sempre.
            Eu não tinha muitos amigos ali, mas tinham três pessoas que eu gostava bastante também, eram o Thiago, o Roberto e o Leonardo. Roberto e Thiago não foram naquele dia, e tiveram suas provas devidamente ridicularizadas também. Não entendendo como eu teria tirado zero já que eu tinha estudado muito praquela prova, fui falar com o Leonardo. Comparamos as provas e nossas respostas eram bem parecidas e as notas eram as mesmas. Zero. Leonardo se dava com um cara, o Diego. Eu não curtia muito o magrão porque ele era amigo dos 6 filhos da puta, mas... Era só uma antipatia por ser amigo de inimigos meus, não faria nenhum mal a ele, mas também nenhum bem. Então, Leonardo mostrou a prova para o Diego esse, que tirou 5 de 5, e... NOSSAS RESPOSTAS BATIAM. Cara, aquilo começou a fazer uma raiva gigantesca crescer.
            Infelizmente nós descobrimos isso tarde de mais, e o prazo de dois dias para se reclamar de correções já havia expirado. E o Thiago não aparecia e ninguém atendia na casa dele nem celular.
            No terceiro dia depois da entrega das provas, tivemos aula de novo com o filho do capeta. Ele chegou em aula pedindo para destacarmos uma folha do caderno, ditou um exercício e queria ver antes da segunda aula que ele ia corrigir e devolver no dia. Disse que ia nos dar um presente pro final de semana.
            Pois bem, fiz e entreguei. Dez minutos depois ele me chamou e me entregou. 0,3 de 1.
            - Melhor que zero... – falei e ele só riu com aquele sorriso... Maldito sorriso...
- Tudo bem, cara? – Lúcia perguntou e um armário já segurava o meu braço.
            - Tudo, tudo. – Ela fez um sinal e o armário soltou meu braço.
            Me sentei e fiquei olhando o exercício. Virei a página. Uma mensagem.
            “A tua imaginação não está brincando contigo.”
            Arregalei os olhos e olhei pro demônio. E ele simplesmente... simplesmente... SORRIU!
            Não lembro do que aconteceu depois, acordei no meu aposento com um galo na cabeça e o punho calejado.

Dedicado ao grande amigo e Co-autor Thiago Ávila Pouzada

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