sexta-feira, 29 de março de 2013

As Crônicas de Folsom - A estrada de ferro pt. 2 de 3

            Viu-se de volta ao saloon. Dessa vez bebia. Bebia para esquecer Mary Ann. Sabia que jamais iria conseguir... Aqueles olhos azuis... Os via em toda a parte. Até hoje... Oh, Mary Ann... Era a mulher perfeita. Por que ele tinha que ter ido ao cabaré naquela noite? Era rotina já, sim, mas não confiou no seu instinto. Sempre confiava nele quando a situação ficava feia. Mas naquele dia... Mas a puta morena era muito gostosa...
            Ela tinha exagerado também, afinal, o adultério não era privilégio apenas seu, pensava. Sabia que ela dava seus pulos. Tanto que tinha despachado dois... Ou mais... Não lembrava ao certo, entretanto, pegou a todos no ato. Contudo, entendia porque ela fazia isso. Mary Ann, ao ser pega traindo, sentia-se mais amada do que nunca, pois sabia que Billy iria marcar o seu território. Iria tomar de volta para si o que era seu de direito. À força.
            Porém, a recíproca não era verdadeira. Ela jamais perdoaria a traição, ainda mais com uma puta.
            Oh, doce Mary Ann...
            Ao longe, ouviu o apito de um trem, mas a lembrança da amada, apesar de dolorosa, prendia-o ali.
            O apito aumentava.
            Oh, Mary Ann!
            Dessa vez o apito arrancou-o de lá e o arremessou de volta ao mundo dos despertos. Meio grogue por causa do litro de Jack Daniel's, do qual só sobrou a garrafa no chão da cabine do caminhão; do baseado caído sobre a enorme barriga, que acabou queimando a camisa antes de se apagar. Olhou em volta. A sua esquerda, viu uma luz muito forte, que o fez girar rapidamente a cabeça na direção oposta. O mundo girou mais rápido ainda, causando náuseas, e o apito, agora, era ensurdecedor. Quando tentou xingar a coisa e sentiu o vômito subindo-lhe a garganta.
            O caminhão tremia e estalava. Os ruídos eram como se estivesse dentro de um liquidificador cheio de pedras. O último apito, que ainda soava, tornava-se cada vez mais alto e já beirava a loucura. Então, um estrondo explode ao seu lado, arremessando-o violentamente para a direita. A porrada foi tão forte que apagou Billy instantaneamente.

            Ao acordar, estava em um lugar rodeado pela penumbra. Havia um círculo de luz a sua frente, como se fosse criado por velas, porém, por mais que procurasse, não conseguia encontrar a origem de tal fenômeno.
            Levantou-se com dificuldade, devido a uma estranha falta de força nas pernas e uma constante vibração suave - com picos mais violentos e periódicos. Começou a tatear as paredes ao redor, tentando se situar. Sentia que eram todas muito frias, mas feitas do mesmo material. Metal, presumia. Pensou que poderia estar dentro de um de container, mas aquela vibração cadenciada, a qual conhecia bem, dava-lhe uma pista.
            Então ouviu uma risada. Ela era grave, potente e frenética. Olhou ao redor e não viu ninguém. Num primeiro momento, era como se a risada saísse de toda a parte. A iluminação começava a se expandir aos poucos, e ele pôde ver que, de fato, as paredes eram feitas de metal. Pareciam enferrujadas. Era um misto de tons como ocre, laranja e escarlate. Um medo súbito do desconhecido começou a se apossar de seu corpo. Seus pulmões hiper ventilavam e, assim, começou a sentir um forte cheiro de urina, sangue e fezes.
            Uma névoa amarelada extremamente mal cheirosa e sufocante começava a tomar conta do ambiente. A risada continuava no mesmo tom, mesmo tendo já se passado quase um minuto. Era como se a pessoa que risse, não fazia o menor esforço, ou tinha um fôlego infinito.
            Assustado, suas pernas tornaram a falhar. Tentando buscar o equilíbrio, escorregou em algo úmido e caiu. Pelo cheiro, notou que era sangue. Levantou-se tentando manter a calma e, agora, a parca iluminação tomava conta de todo o lugar. Pôde perceber, assim, que os tons escarlate - não só nas paredes, como no chão e no teto - eram de fato sangue. Algumas manchas eram frescas, outras eram do plasma já coagulado.
            Quando tornou a olhar para frente, viu algo novo: um homem trajando um macacão jeans azul todo manchado de óleo e uma espécie de cartola listrada verticalmente em branco e azul. Ela tinha uma aba da mesma forma que um boné, que fazia sombra aos olhos. Esses, por sua vez, emitiam apenas um brilho amarelo como enxofre. O sujeito tinha a pele toda vermelha com grossos pelos pretos que lhe saiam pelos braços. Estava de pés descalços e ostentava um fino bigode que acompanhava a coloração dos demais pelos do corpo.

            Atrás dele, via algo que não estava lá antes. Aquilo se assemelhava a uma fornalha, cuja as labaredas de fogo eram cuspidas ao teto e, por vezes, engoliam aquela figura, que não parecia se importar. Billy olhava sem entender, e a asquerosidade apenas ria.

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